Carro elétrico ressuscita o velho lobby das montadoras

 

Depois de anos de discussão em torno do motor 1.0, agora a briga envolve importação de modelos eletrificados

 

Ao longo das últimas décadas, a indústria automobilística sempre foi apontada como um dos setores mais protegidos no país e com mais força para convencer governantes a executarem leis ao sabor das suas estratégias.

 

Num momento histórico para o setor, sob pressão mundial para deixar de produzir veículos poluentes, essa indústria está prestes a pôr em prática, novamente, a força do seu lobby no Brasil.

 

No próximo dia 31 deixa de valer a resolução que reduziu o Imposto de Importação de carros híbridos e elétricos. Existe a possibilidade de a equipe econômica encontrar uma ferramenta para manter as alíquotas como estão e daqui a um ou dois meses promover a elevação do tributo, pelo menos em modelos híbridos.

 

As alíquotas hoje variam de 0% a 4% para modelos híbridos e elétricos, dependendo do nível de emissões, entre outros. Em conversas com o setor, segundo representantes das empresas, o governo já teria manifestado a intenção de elevar as alíquotas para 2% a 7%.

 

Sob o argumento de que o mercado da eletromobilidade no Brasil “ainda está em formação”, há pouco tempo, a Associação Brasileira do Veículo Elétrico (ABVE) defendeu a extensão, até 2026, das atuais alíquotas, que fazem parte da Lista de Exceções à Tarifa Externa Comum do Mercosul (Letec).

 

Mas essa discussão não envolve simplesmente dois lados – montadoras e governo. Como sempre, existem interesses divergentes dentro da indústria.

 

Uma parte das empresas com fábricas no Brasil já demonstra interesse no desenvolvimento de projetos para a produção de carros híbridos que possam ser abastecidos com etanol. Esse grupo já está de olho, portanto, na movimentação dos incentivos para veículos eletrificados produzidos em outros países. Esse grupo tende, assim, a apoiar, nos bastidores, qualquer aumento no Imposto de Importação desse tipo de veículo.

 

O cenário repete o que já se viu em outros momentos da história dessa indústria. No passado, as discussões envolviam as cilindradas dos motores a combustão. Os episódios mais marcantes e duradouros envolveram disputas em torno de incentivos para carros com motor 1.0, que, à época, eram chamados de populares.

 

O assunto provocou uma série de embates, dentro do setor e nos acordos com o governo. As marcas que produziam elevados volumes de carros populares defendiam a preservação de incentivos. O assunto se arrastou por tanto tempo que, com o passar dos anos, as equipes de engenharia passaram a “turbinar” o motor 1.0. Até hoje o IPI desse tipo de carro é menor – alíquota de 7%, enquanto nos demais varia entre 11% e 25%.

 

Desta vez, porém, não há muito tempo para discussões. De uma lado, as matrizes das montadoras estão sob pressão para prestar contas favoráveis à causa ambiental. Ao mesmo tempo, o governo brasileiro faz contas para calcular como arrecadar mais.

 

Para os que representam as montadoras, porém, nunca é tarde para brigar por mais um incentivo – ou derrubá-lo. O decreto do programa Rota 2030 foi assinado por Michel Temer nos últimos dias de seu mandato, dentro do Salão do Automóvel, em São Paulo.

 

Reuniões com o governo para discutir a futura carga tributária dos carros híbridos e elétricos estão previstas para acontecer na véspera da virada do ano.

 

Por Marli Olmos — São Paulo

 

https://valor.globo.com/empresas/noticia/2021/12/15/carro-eletrico-ressuscita-o-velho-lobby-das-montadoras.ghtml

 

 

28 dez

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